
Em tempos de Enem e vestibulares é comum me pedirem dicas para escrever um bom texto. Dentre as tantas que já existem na internet, vídeos e materiais, algo que de fato chama a minha atenção nas redações que recebo são os vícios de linguagem.
De fato, principalmente no português brasileiro, é muito difícil para nós, falantes dessa variante, usarmos a modalidade padrão da língua.
Tal conjuntura tem a ver, nomeadamente, com fato de que no Brasil a distância entre o português falado no dia-a-dia e o português que nos é ensinado na escrita, dessa mesma língua, é discrepante.

Assim, as principais inadequações de escrita sobre as quais tenho que me debruçar nas correções têm a ver, justamente, com o fenômeno descrito. Ou seja, tentar aproximar ao máximo a escrita dos alunos da modalidade escrita, afastando o discurso do tom de oralidade que os recursos linguísticos utilizados por eles criam.
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Dentro os inúmeros, os vícios de linguagem que eu poderia elencar, escolhi falar, nesse breve artigo, sobre dois que se revelam “campeões”, tendo em vista a recorrência com que aparecem nos nossos diálogos e, claro, são migrados para a escrita. Esclareço abaixo.
Frequentemente ensino aos meus alunos, nas aulas de redação dissertativa argumentativa, quanto ao do Gerúndio nos seus textos – também chamado de modismo linguístico.
Gerúndio é uma das formas nominais do verbo, quando a conjugação da ação não tem marcação de tempo nem de modo; vêm acompanhados, geralmente, de outro verbo, chamados auxiliar. Por exemplo:
Maria estava comprando uma máscara.
Maria foi comprar uma máscara.
Maria tinha comprado uma máscara.
Veja que em todos os exemplos acima, os verbos “nominais”, destacados – gerúndio, infinitivo e particípio – estão acompanhados de um verbo que identifica a ação, sobretudo, no tempo.
Mas por que eu faço essa ressalva aos alunos quanto a não utilizar, ou evitar, principalmente, o gerúndio nos seus textos? Posso elencar alguns motivos.
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Primeiro, essa forma do verbo não expressa uma ideia concreta, e sim um processo; algo que está a decorrer. Sendo assim, torna-se inadequado o seu uso, pois sabemos que no texto dissertativo precisamos elencar ideias já fomentadas e não ações que ainda estão a acontecer.
Além disso, o gerúndio funciona como um recurso da oralidade e, dessa forma, diversos modismos são ativados na fala quando o utilizamos. Por fim, essa forma verbal traz uma marcação de tempo ao texto, um tom de narrativa, uma história que está a ser contada.
Ou seja, se usarmos o gerúndio ao invés de uma das formas modais dos verbos, nosso texto, que deve ser dissertativo, ganha um tom narrativo – o que causa uma incoerência na tipologia textual.
Devemos lembrar que narrativa é a tipologia textual usada, especialmente, em textos literários como contos e romances.
Outra marcação de texto narrativo e oralidade que, frequentemente, vejo os alunos utilizarem nos textos dissertativos são os advérbios de tempo. Veja, os advérbios são elementos facultativos da construção da frase, que surgem nas orações para dar uma informação circunstancial às ações. Ou
seja: quando, como, com quem, de que forma, entre outras circunstâncias sobre aquela ação.
Dessa forma, os advérbios, acabam por trazer também esse tom narrativo, descritivo, e cronológico ao texto. Logo, tal recurso deve ser evitado, pois assim como o gerúndio, outros modismos e vícios de linguagem se sucedem e fazem com o que texto perca o tom expressivo que se busca – ou que devia ter.
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Você poderia perguntar agora: devo, então, não usar o gerúndio e os advérbios de tempo na minha redação, ou mesmo nos meus textos dissertativos em geral? Não necessariamente!
A grande questão é que esse fenômeno da oralidade resulta em um texto redundante e que dá voltas em si mesmo, não saindo do lugar – perde-se a fluidez. Portanto, quanto menos utilizarmos modismos linguísticos, mais palavras “economizamos”; a concisão é consequência e a clareza resultado.
O leitor agradece!
— * Alessandra Helena Corrêa, santarena, é graduada em licenciatura plena em Letras (Ufopa). Faz mestrado atualmente em Estudos Literários, Culturais e Interartes na Universidade do Porto, Portugal, onde reside. No Instagram: @alehhelena.
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Pertinente sua explicação. Devo concluir que nas produções textuais devemos evitar o gerundismo, mas nas produções orais, por estar tão enraizado em nossa cultura, torna-se praticamente impossível. Recebo até mesmo e-mails corporativos com “vamos estar fazendo”, então pergunto a você: O que podemos estar fazendo para diminuir este uso inadequado na nossa fala?