
Não existe uma resposta absoluta sobre o surgimento das primeiras religiões no mundo. Muitos estudiosos supõem que os primeiros sinais de práticas religiosas tenham surgido há 40 mil anos, através de estátuas e pinturas que demonstram consciência espiritual daquela época.
O culto a seres superiores foi uma forma dos primeiros fiéis explicarem a origem do mundo onde viviam, a existência dos diversos fenômenos naturais e até mesmo a própria existência humana. As representações esculpidas ou pintadas são heranças desses tempos iniciais de crenças.
Ao longo de milênios, incontáveis religiões foram surgindo, desde as politeístas, que são aquelas que acreditam na existência de vários deuses, como as famosas mitologias gregas e egípcias, até as monoteístas, que acreditam na existência de um único deus, como o judaísmo e o cristianismo.
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É frequente em muitas conversas uma ou mais pessoas afirmar que “religião não se discute”. Durante um diálogo qualquer, essa frase chega a encerrar, meio que de forma obrigatória, os raciocínios de quem estava na conversa, ficando por isso mesmo. Uma frase que se torna intocada e perfeita a muitos pensamentos.
A ideia de “discussão” para muitas pessoas nos dias de hoje teria um único significado, que seria “briga”. Se alguém esta discutindo com outra pessoa, elas estariam se insultando, fazendo acusações, nada mais. Entretanto, é necessário buscarmos mais a fundo o entendimento de uma palavra que não se limita a um único conceito.
Afinal, será mesmo que a religião não se discute?
De acordo com o dicionário Aurélio, o verbo “discutir” tem como primeiro significado “apresentar questões acerca de alguma coisa; analisar apresentando questionamentos; examinar”. “Discutir” só a a significar “briga” na quinta e última definição do dicionário.
Etimologicamente falando, de acordo com o Aurélio, “discutir” deriva da palavra latina “discutĕre”, da qual o prefixo “dis” significa “separar” e “cutĕre”, forma de “quatĕre”, que significa “sacudir, agitar ou bater”.

Para o professor de língua portuguesa Sérgio Nogueira, é comum que as palavras mudem não somente o formato da escrita como elas ganham mais significados ao longo do tempo. Ou seja, uma única palavra pode ter vários sentidos.
Didaticamente falando, discutir religião não é necessariamente brigar ou fazer acusações com outra pessoa porque ela frequenta outro templo. Não se deve levar apenas pelo lado negativo, sabendo que o termo tem outros sentidos. A importância de discutir está justamente na busca pelo entendimento das diferentes crenças, das inúmeras culturas, fazendo com que a sociedade, mesmo com diferentes pensamentos religiosos, possa caminhar de mãos dadas.
Assim, mesmo tendo suas regras próprias e maneiras diferentes de ensinar, todas as religiões basicamente buscam um significado pra vida, conforto espiritual, garantia de salvação após a morte, estabelece vínculos comunitários e buscam conexão com o divino. Isso nos faz entender que as religiões tem questões importantes que devem ser levadas para uma discussão, que não pode ser confundida com briga.
Sempre há confusão quando se associa “discutir” com “desrespeitar”, o que já seria diferente. Não é obrigado a levar apenas pelo “lado ruim”. Enquanto discutimos, fazemos análises de determinado assunto, mas também ouvindo o que o outro tem a falar. No final das contas, deve haver uma sintonia nos raciocínios e chegar a um resultado favorável a todos.
Em situações que a cultura de outra pessoa é ignorada e é rebaixada, sem ao menos ouvir o que o outro tem a dizer, nesse caso há sim o desrespeito e o preconceito, principalmente pela ignorância, por não permitir que se entenda determinado seguimento, abraçado por muitas pessoas e que tem o seu ado, gerações e histórias.
É notável, por parte de muitos fiéis, haver pensamentos de ódio quando se acusa alguém porque não segue a crença do acusador. Quem acusa se autointitula o verdadeiro e o correto. São atitudes que muitas vezes são contrárias à crença que ele próprio segue.
❒ Cor e debate ideológico: Nossa bandeira já foi vermelha, e a camisa da seleção brasileira também.
Esse atrito entre diferentes religiosos criam muros, ao invés de pontes, desfavorecendo a harmonia e levando a situações de raiva e medo no meio social, situação contraditória ao que se prega e se aprende nas cerimônias religiosas.
A boa discussão permite o conhecimento, o entendimento e o respeito entre os diferentes religiosos, fazendo valer o artigo 5º da Constituição Federal do Brasil, que fala sobre a liberdade de crença, definindo-o, assim, como um país laico.
Um país que, de acordo com o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), teve registro de 3.853 violações motivadas por intolerância religiosa em 2024. Um aumento de 80%, se comparado com 2023, que teve 2.128 casos. Situações como essa que nos faz pensar: por que religiosos tratam mal outros religiosos, sendo que a própria religião não segue essa ideia?
Este texto, caro leitor, foi uma forma de discutirmos a religião. Você leu, refletiu, analisou os dados, as outras informações e pode ser que tenha associado a um ocorrido que veio à sua mente. Assim, você pode ter chegado a alguma conclusão, que você tenha concordado ou não, mas sem ter a necessidade de briga e de raiva.

Ou será que algum parágrafo deste texto te incomodou e fez você discordar de muita coisa escrita aqui?
De todo modo, podemos concluir que se deve sim discutir a religião, assim como discutimos assuntos de história e filosofia em sala de aula ou algum tema específico em palestras.
Discutimos para conhecer e para aprender. As religiões têm seus lados positivos e negativos ao longo do seu ado, que não podem ser omitidos, mas levados a debate pelo propósito de sempre alcançar o respeito no meio social no presente, para que se construa um futuro ideal para todas as diferentes religiões.

❒ Silvan Cardoso é poeta, cronista e pedagogo nascido em Alenquer, no Pará. Escreve regularmente no JC. Leia também dele: Alenquer, 143 anos: quem come seu acari não quer mais sair daqui. E ainda: Canhoto, o dono do lanche que virou point em Alenquer; vídeo.
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