A queda de um gigante da política de Gurupá. Por Fábio Alho

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A queda de um gigante da política de Gurupá. Por Fábio Alho
Gurupa, ciclo histórico do PT se fechando, segundo Fábio Alho. Foto: Reprodução

O município de Gurupá (PA), na região do Marajó Ocidental, está prestes a fechar um ciclo histórico na política municipal. Pela primeira vez, após os 44 anos de fundação do Partido do Trabalhadores (PT), a legenda não lançará candidato a prefeito da cidade. Isso se deve, principalmente, ao declínio político dos movimentos de esquerdas, e ascensão da política de centro-direita, iniciada em 2016 com a vitória da então candidata da oposição na época, sendo posteriormente cassada.

Analisando o PT atualmente, quase não conseguimos imaginar o quanto ele já foi influente e praticamente inderrotável nos pleitos eleitorais, conquistando grandes feitos vitoriosos nas corridas pelos poderes Legislativo e Executivo. No entanto, a conquista dessa hegemonia se atribuiu a excessiva militância e conjuntura política de caráter populista e social, dialogando com as classes sociais menos favorecidas da época.

Historicamente, o PT de Gurupá nasceu do berço das Comunidades Eclesiais de Base – CEB’s, dirigido por lideranças camponesas, trabalhadores e quilombolas, tendo como alicerce de formação a Igreja Católica ligada à Teologia da Libertação que efetuava forte oposição aos desmandos da ditadura militar.

Essa abordagem de libertação dos oprimidos desencadeou com a chegada do padre Giulio Luppi, servindo como intelectual e educador popular do conjunto dos trabalhadores, estes viviam as mazelas de uma região dominada pelas oligarquias locais de extrema-direita.

Dessa forma, surgiu um forte movimento partidário de esquerda que mobilizou majoritariamente as estruturas públicas de Gurupá, abarcando a paróquia, comunidades e Sindicato dos Trabalhadores Rurais – STR.

O primeiro pleito eleitoral disputado foi em 1982, no qual o PT conseguiu duas cadeiras no Legislativo, sendo esses os primeiros vereadores petistas eleitos em todo o estado do Pará e também uns dos primeiros do Brasil (feito histórico).

Nas eleições presidenciais de 1989, Gurupá foi o único município paraense que Lula venceu Collor no segundo turno do pleito eleitoral (outro feito histórico).

Mas foi nas eleições de 1992 que o PT conseguiu eleger o primeiro prefeito para o governo local, isto é, alcançou a posição de maior autoridade um trabalhador rural que tinha como promessa oportunizar um maior diálogo governamental com a classe trabalhadora gurupaense. No entanto, a gestão não atendeu por completo as expectativas populares, de modo que facilmente ocorreu o retorno ao poder da poderosa elite da época.  

A virada de chave ocorreu no pleito de 2000, considerada a mais acirrada já acontecida. A burguesia econômica buscava uma reeleição com uma candidata de família tradicional da velha política e forte aliança empresarial da cidade. Contudo, o PT fez uma forte base de militância com sindicatos, CEB’s, pastorais, associações, cooperativas e demais entidades de cunho social que resultou em uma vitória autêntica.

Doravante, a isto, o PT se consolidou como uma força descomunal na política, tendo seu auge hegemônico em quatro mandatos consecutivos – em 2001/2004, 2005/2008, 2009/2012 e por último 2013/2016, todas essas gestões dirigidas por camponeses, lideranças sindicais e membros das CEB’s, marcadas por considerável participação das bases sociais da sociedade civil.

Dessa forma, foram implementados significativos investimentos no campo da educação, tais como aprovação do plano de carreira dos professores, valorização salarial do magistério (inclusive para temporários), implementação dos escolões na zona rural, divulgação e realização de inúmeros concursos públicos em todos os mandatos, entre outras ações conjuntas.

Entretanto, no último mandato percebeu-se uma evasão de representatividade popular nos atos decisórios de forma gradual, colaborando para uma reprovação do governo. Ademais, ocorreu uma ruptura entre duas lideranças políticas, que acarretou um antagonismo de interesses dentro do próprio partido, favorecendo a derrota eleitoral em 2016.

Após duas tentativas frustradas (2016 e 2020), os dirigentes e militantes do PT publicaram nos últimos dias que apresentarão candidato a vice-prefeito, na eventual chapa encabeçada por Fabíola Coração Valente, do PRD (centro-direita), com grande aprovação por parte dos envolvidos.

A queda do PT em Gurupá não representa apenas um ciclo encerrado, mas, talvez, um horizonte de novas figuras políticas para conduzir os munícipes nos próximos anos.

Outrossim, a respeito de uma cidade com problemas básicos em infraestruturas, ausência de transparência nos cofres públicos e salários extremamente baixos para o funcionalismo temporário, sobretudo, para uma população que necessita estreitamente dos serviços públicos e ações assistencialistas. 

Fábio Alho

É professor, pesquisador, escritor, quilombola e doutorando em Educação pela Universidade Estadual de Londrina (UEL). Os processos educacionais e histórico-políticos de Gurupá fazem parte de sua pesquisa de doutorado.

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One Response to A queda de um gigante da política de Gurupá. Por Fábio Alho

  • Muito boa sua análise política, bem suscita, onde narra fatos históricos com extrema precisão e realismo. Muito bom

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